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Produtos criam estereótipos
Uma das maneiras mais óbvias que a narrativa da velhice – construída nos séculos XIX e XX -, influencia até hoje produtos para pessoas idosas que caem na bipolaridade carente/consumista são: incentivo aos exercícios físicos, novos medicamentos e aplicativos para lembrar a hora dos remédios, por um lado, e navios de cruzeiro, viagens internacionais e compras em Miami, por outro.
Há mais na vida do que as coisas que compramos. E, no entanto, há boas razões para acreditar que a chave para uma velhice melhor, mais longa e mais sustentável possa estar apenas em produtos melhores, especialmente se definirmos amplamente “produto”: como tudo o que uma sociedade constrói para as pessoas, de gadgets eletrônicos a alimentos funcionais passando pela infraestrutura de transporte.
Vejamos os aplicativos de mensagem de texto: originalmente anunciados para adolescentes tem sido uma dádiva dos deuses para os surdos. Ajudas técnicas oferecem soluções maiores do que as necessidades básicas das pessoas com deficiência, incluindo ainda as necessidades das pessoas mais velhas.
O controle remoto para abrir o portão de garagens é um bom exemplo: foi projetado para auxiliar no levantamento de portas pesadas. Hoje, são atraente comodidade, e um item de segurança importante, para todas as pessoas incluindo os idosos.
O campo nascente dos equipamentos para “ouvidos” – fones capazes de traduzir línguas em tempo real ou aumento de certos sons ambientais – podem finalmente tirar o estigma dos aparelhos auditivos. Ainda mais importante do que aquilo que os produtos fazem são as narrativas do que eles dizem fazer.
Poderíamos escrever uma centena de artigos exaltando as virtudes dos idosos, mas qualquer efeito positivo que eles tenham na percepção do público seria superado em muito por um único produto infantilizante nas prateleiras das lojas. Quando uma empresa produz algo que trata as pessoas mais velhas como um problema a ser resolvido, todos recebem a mensagem negativa imediatamente.
Os produtos perpetuaram a narrativa redutiva da velhice em um ciclo vicioso que dura décadas. Vejam como funciona: produtos dirigidos às pessoas mais velhas reforçam uma imagem de idosos como consumidores passivos na mente do público; então, quando uma pessoa mais velha se candidata a um emprego, ela tem que lutar contra esse senso comum que ela, uma consumidora por natureza, não pertence a este grupo passivo, e portanto, ela poderá ser ativa no cargo que concorre.
Como mudar nosso pensamento
Temos dificuldades em aceitar que o mercado lança produtos que não condizem com a realidade e nem com a necessidade dos idosos e, que isto, só alimentará os mitos do que seja o envelhecimento e a velhice. E aí é que reside nossa grande dificuldade.
A desigualdade de renda e as desigualdades sociais se cruzam com o envelhecimento de maneiras diferentes e preocupantes. Na Europa e Américas, os mais ricos e brancos têm maior probabilidade de estarem melhor preparados financeiramente para a aposentadoria, além de terem condições de serem mais saudáveis e viverem mais.
Mudar a forma de pensarmos sobre os idosos, e sobre os produtos que eles necessitam, não resolverá as desigualdades, mas pode – pelo menos – tornar menos frequente a demissão de alguns idosos e ajudar outros a encontrar empregos com melhores salários.
Por outro lado, criar uma novo conceito para a “velhice”, de um período de passividade para um marcado por novas atividades, certamente, ajudará na visão que se tem dos adultos de meia-idade. Quando falamos em mudar o significado do terço final (ou mais) da vida, ainda, não sabemos das consequências que terão nos estágios iniciais.
Talvez a promessa de um futuro melhor não importe muito para as pessoas de 20, 30 e 40 anos. O que podemos perguntar é se uma nova imagem e mais realista da velhice pode motivar os trabalhadores mais jovens, e os de meio de carreira, a economizar mais para o futuro e, também, levá-los a exigir mais benefícios dos empregadores para uma melhor aposentadoria. Pela primeira vez, eles podem encontrar-se economizando não para uma pessoa idosa hipotética, mas para uma versão melhor de si mesmos.
Os tecnólogos, especialmente os fabricantes de produtos de consumo, terão uma forte influência sobre como viveremos amanhã. Ao tratar os idosos não como um mercado periférico e auxiliar, mas como um núcleo importante, o setor de tecnologia pode contribuir para criar novo conceito de velhice e envelhecimento.
Pedir aos jovens designers que se envolvam com os consumidores mais velhos é um bom começo, mas não é suficiente para lhes dar uma verdadeira visão dos desejos dos consumidores mais velhos. Felizmente, existe uma rota mais simples: contratar designers mais velhos. É preciso pensarmos seriamente em termos trabalhadores idosos construindo conhecimento ao lado de jovens.
O envelhecimento global pode ser inevitável, mas a velhice, como a conhecemos, não é. É algo que inventamos. Agora, cabe a nós refazê-lo.